sábado, 9 de fevereiro de 2013

Puro luxo


 
   Discordo de quem classifica o gênero musical de Lana Del Rey como indie. Ela pode perfeitamente ser considerada uma cantora pop. Afinal, o que faz um artista pertencer ao universo alternativo? Produzir um trabalho cuja estrutura não se enquadra nos padrões comerciais do mainstream? Dar um descanso a tantos ouvidos molestados pelas execuções incessantes dos hits indigestos que as rádios disponibilizam todos os dias? Contemplar um determinado grupo que precisa de suporte estético e cultural para enriquecer seu próprio estilo? E se esse artista se tornar extremamente conhecido fora desse círculo, ele deixará de ser alternativo?
   É difícil dizer. Na maioria dos casos, o êxito financeiro proporciona o amadurecimento técnico, que, por sua vez, facilita o entendimento da música por parte do grande público, tornando-a mais acessível para aqueles que não acompanharam a carreira da banda ou do(a) cantor(a) desde os primórdios. Ou então, utilizam-se ações de marketing para promover um nome até alçá-lo à posição de superstar  internacional. E é esse o caso que mais se adequa à realidade de Lana. 
   Nascida em junho de 1986 em Nova York  sob o nome de Elizabeth Woolridge Grant, a cantora teve seu nome artístico inspirado na combinação dos nomes da atriz Lana Turner (uma das mais bem pagas de Hollywood nas décadas de 1940 e 1950) e do carro Ford del Rey (suponho que seja o modelo que aparece ao fundo na fotografia de capa de Born to Die), detalhes essenciais para sua fabricação. A herdeira do milionário Robert Grant, entretanto, já havia investido na carreira musical, de modo não tão bem-sucedido, em 2010, com o lançamento digital do álbum de estúdio Lana Del Ray A.K.A. Lizzy Grant – com “a” mesmo em “Ray” – pela  gravadora independente 5 Points Records. O disco chegou a ser comercializado no iTunes, mas foi retirado depois de pouco tempo, já que o selo não tinha condições de promovê-lo. Dentre suas 13 faixas, inclui-se “Yayo”, que mais tarde seria regravada para preencher o repertório de Born to Die – The Paradise Edition. Após ter comprado os direitos, Lana admitiu ter interesse em relançar seu álbum “perdido” em breve. 
   Concebendo-se Born to Die como sua estreia oficial – esta sim, com o auxílio de uma grande gravadora – é possível chegar aos motivos que a transformaram em uma queridinha indie. A divulgação dos primeiros singles pelas rádios dos Estados Unidos e da Europa geravam uma expectativa crescente acerca do que viria dali em diante. “Video Games”, acompanhante das viagens de carro por ruas arborizadas e margeadas por resquícios de neve, é o equilíbrio perfeito entre uma letra bem escrita e uma bela orquestração. “Blue Jeans” evidencia as referências da jovem: final dos anos cinquenta e início dos anos sessenta, o cinema de Hollywood, especificamente James Dean, e ícones musicais como Elvis Presley e Nina Simone.  
   A faixa-título do álbum reforça as ótimas composições que a caracterizam, assim como seu alcance vocal e suas arriscadas mudanças das tonalidades graves para as mais agudas. Não creio que o mérito deva ser integralmente atribuído ao famigerado Auto-Tune. Com exceção da desastrosa performance no programa Saturday Night Live, comprometida devido ao nervosismo e à timidez, Lana Del Rey não costuma deixar a desejar ao vivo. 






   Com “Off to the Races”, é fácil imaginar o cenário opulento descrito em mais uma de suas criações, que contam com traços autobiográficos: a piscina de uma mansão cinematográfica de L.A., cigarros, drinks, cassinos, hotéis. É interessante também notar a evolução quanto ao culto à imagem: se, no início, seus clipes guardavam o suave sabor dos vídeos caseiros, a exemplo de “Video Games” e a primeira versão de “Blue Jeans”, agora, em “National Anthem”, passam a ser verdadeiras superproduções. A cantora se inspira em Marilyn Monroe ao recriar o famoso episódio no qual a atriz cantou “Parabéns pra Você” na comemoração do aniversário do então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy, em 1962,no Madison Square Garden. "O dinheiro é o hino do sucesso", e só através dele há vida, luxos, sexo, excessos de álcool e drogas, morte. Ela não aparenta fazer esforço para se desvencilhar do estereótipo de garota rica e imoral.  É a partir daí que a pegada mais hip-hop ronda algumas das demais faixas, como “Dark Paradise”, “This Is What Makes Us Girls” e a adicional “Lolita” (equivocada leitura do romance de Nabokov), que parecem pertencer a um trabalho completamente diferente. É quase preocupante constatar a persistência de Lana nos arranjos orquestrais introdutórios, que deixam as músicas tão espontâneas quanto comerciais de bebida em locações paradisíacas. Isso fez com que seu nome fosse vinculado ao pop barroco, subgênero da música pop. Por outro lado, “Radio”, “Carmen” e “Million Dollar Man” (menção à Fiona Apple de Tidal) merecem destaque. 




   Já Born to Die – The Paradise Edition, seu mais recente disco, é um presente aos fãs, composto por 8 faixas inéditas. Aqui, ela revela mais segurança ao seguir uma linha melódica semelhante na maioria das canções. Eis que os elementos característicos são a cultura norte-americana, o espírito aventureiro de On The Road, homens mais velhos, rock’n’roll e sua interpretação para o clássico “Blue Velvet”. A polêmica “Cola” e seus dois primeiros versos flutuantes renderam a etiqueta “Parental Advisory: Explicit Content” no canto inferior direito da capa. A qualidade lírica, ainda que minimamente, parece ter sido relegada a segundo plano, porém,  resulta em faixas memoráveis, tais como “Ride”, “Body Eletric”, “Gods & Monsters” (por favor, não diga que você está vivendo como Jim Morrison) e “Bel Air” – o último resgate do vício das orquestrações artificiais de seu álbum anterior. 

   Acredito que Lana seja uma artista com potencial a ser desenvolvido e de ótimas influências  (Leonard Cohen, Janis Joplin e The Eagles são algumas delas) e escolhas sensatas. Pop, indie, alternativa ou não, espero que ela prossiga fazendo o que faz - de maneira ainda melhor. 







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